sábado, 28 de novembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (7)
1.5 Saúde, Educação e Lazer (1)

A Fazenda Suissa fica entre Lins e Marília, distando aproximadamente 40 quilômetros de ambas as cidades. As estradas eram precárias e os meios de transporte escassos. Por isso se fazia necessário uma estrutura física e serviços completos para atender a população residente de mais de 1000 pessoas. Vimos anteriormente que tinha instalações tanto para a produção e manutenção, como para atender as necessidades cotidianas seja o armazém, o açougue, a escola, a farmácia ou o clube.

Saúde:

 “Prof.Dr. Robert Hottinger, por nós crianças chamado de “Onkel Robert”, era naquela época o único amigo íntimo de nosso pai. Por volta de 1898 ele foi convidado para vir ao Brasil pela Escola Politécnica de São Paulo, à princípio assumindo uma cátedra na medicina veterinária, depois por sua versatilidade e talento genial, foi professor de química. Também devia entender muito de biologia porque patenteou as moringas Salus, potes de barro que transformavam água contaminada em água potável e o Bolusargel , uma mistura de prata e argila eficiente contra toda sorte de disenteria, substância indispensável para nós.”  
 Assim descreve Max Wirth Junior o melhor amigo de seu pai, o pioneiro Max Wirth fundador da Fazenda Suissa.

Juntos os amigos chegaram a desenvolver um projeto chamado Vitafarma para produzir vacinas contra a poliomielite e outras doenças. Infelizmente essa iniciativa, apesar de diversos esforços, não vingou, mas a amizade trouxe benefícios significativos para a saúde dos colonos, pois havia tanto um médico, como um dentista e um farmacêutico na fazenda.
Max Wirth Junior conta em sua crônica:

“Senhor Von Scheel chegou à Fazenda Suissa para tratar da saúde das 200 famílias de colonos. Era um homem pequeno, delicado. Apesar da postura ereta de oficial do exército prussiano, sempre se debruçava profundamente para beijar a mão de uma dama. Ele era dentista. Não sabemos se diplomado ou não, se autodidata ou formado às pressas em curso supletivo. Seja como for ele extraía dentes, de preferência sem anestesia, utilizava um rotor movido à pedal para fazer obturações, implantava próteses e dentes de ouro. Ele era trêmulo, mas sempre sorridente, exercia seu ofício utilizando poucos instrumentos porque não havia eletricidade, muito menos ar comprimido ou mesmo água potável para garantir a higiene adequada e nem se fale em aparelho de raios-X. Ele ia de colônia em colônia necessitando apenas um cômodo arejado com a janela aberta... Nunca lhe faltava serviço e desta forma ganhava algum dinheiro, aparentemente suficiente para si e sua delicada esposa. Ela era uma autentica baronesa, sempre pálida e também trêmula, ora contente e amável, ora deprimida e calada; uma mulher que havia conhecido dias melhores e sofria pela precariedade das circunstâncias que somente era capaz de suportar porque seu querido marido lhe providenciava uma tão premente injeção lenitiva em intervalos regulares. Logo não havia mais segredo que a baronesa era dependente de morfina. 


A droga também podia ter sido fornecida por seu genro Dr. Guenther Dietrich, o médico, de quem se dizia a boca pequena que era igualmente viciado. Mas o que nós admirávamos com espanto era sua colossal fúria de fumante, acendendo um cigarro no próximo com incansável maestria, de forma que nos perguntávamos se ele vivia de ar ou fumaça. Nunca mais encontrei uma pessoa que conseguisse soprar a fumaça tragada com tanta força simultaneamente pela boca como pelo nariz! Nas visitas aos doentes das colônias ele sempre vestia seu rígido chapéu de feltro, a gravata escura sobre camisa bem abotoada, suspensórios, bombachas e, no lugar das botas, polainas sobre sapatos de cadarço, enfim um prussiano organizado da cabeça aos pés, nervoso, extremamente disciplinado, um verdadeiro médico, porém ele próprio um sofredor.”

A foto à seguir é uma simulação do conjunto da escola com a casa do farmacêutico ao fundo, a farmácia e a casa do fiscal geral em primeiro plano.



A Sra. Ana Maria de Freitas, filha do farmacêutico Sr. João Wenceslau de Freitas, contou que sua casa na época ficava junto à sala de aula, separada por uma varanda. Depois havia um gramado com uma grande mangueira entre a escola e a pequena farmácia adjacente à casa do fiscal geral. Sr. João exerceu seu ofício na Fazenda Suissa durante a década de 1940, quando o Sr. Von Scheel e seu genro Dr. Dietrich já não moravam mais na fazenda.

sábado, 21 de novembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (6)

1.4 Manutenção, Administração e Abastecimento (2)



Administração: Escritório e Armazém

O escritório, uma das primeiras construções feitas em alvenaria, tem quatro ambientes: a sala do escrivão onde trabalhava o guarda-livros, um corredor bem iluminado com uma bancada para pesar e organizar a mercadoria, o armazém de mantimentos, ferramentas, secos e molhados, além da sala onde eram guardados os tecidos.


O guarda-livros anotava todas as empreitas realizadas e os fornecimentos referentes à 200 contratos familiares nos livros ainda guardados desde 1922 até hoje. Cada contrato tinha um titular que reunia sob sua responsabilidade diversos trabalhadores, membros de uma mesma família. Fritz Loosli conta que para renovar um contrato familiar a fazenda doava uma novilha ao titular como estímulo para a continuidade da família no trabalho.

Além disso, o guarda-livros controlava os estoques do armazém e a venda da produção da fazenda. 


Havia uma linha de ônibus da empresa Pássaro Amarelo que fazia o trajeto Getulina-Garça quatro vezes ao dia. A parada na Fazenda Suissa ficava logo abaixo do escritório em frente à casa do fiscal geral. Como a fazenda tinha boas relações comerciais com a concessionária Ford de Garça eles recolhiam diariamente a correspondência vinda de São Paulo e Santos pela Companhia Paulista de Estrada de Ferro para encaminhá-la até a fazenda através do Pássaro Amarelo.


Abastecimento: Armazém, Açougue e Posto de Combustível

O armazém era aberto aos sábados para os moradores se abastecerem com feijão, arroz, farinha, sal, açúcar e peixe salgado.  Na porta ao lado funcionava o armarinho onde eram vendidos tecidos, agulha, linha, enfim tudo que se fazia necessário para as mulheres confeccionarem as roupas de seus familiares. Havia também alpargatas e botinas para completar a vestimenta e artigos de higiene como sabonetes e pasta dentifrícia. O guarda-livros tinha um ajudante para auxiliá-lo no atendimento. O primeiro guarda-livros foi Willy Schmidt, depois, nesses primeiros 30 anos, o sucederam Walter Beck e Mauro Ebner, do qual Fritz Loosli ainda menino, foi ajudante.

As colônias eram compostas por duas carreiras de casas. O mangueirão, um grande pasto comunitário onde os colonos criavam seus porcos, cavalos e gado, preenchia o espaço entre elas. Cada casa tinha um paiol de milho para complementar a alimentação dos animais. 
Atrás do armazém havia o açougue e a casinha da bomba de combustível para abastecer os caminhões Ford. O abate de animais era feito num matadouro junto ao córrego do Jiquiri e a carne era cortada e distribuída no açougue toda quinzena.


Abastecimento de Água e Energia
A água consumida na fazenda era proveniente de minas. Na casa sede porém havia um poço de 30 metros de profundidade com um catavento que abastecia a caixa d'água elevada. A antiga tubulação de ferro galvanizado ainda é parcialmente utilizada nos dias atuais. O conjunto de caixas de captação reúne a água levada até um tanque localizado aproximadamente 70 metros abaixo do nível da sede. Numa casinha ao lado do tanque há um grande motor movido a óleo diesel utilizado para bombear a água até os grandes reservatórios de alvenaria no alto do morro. Esse sistema funciona até hoje, apenas foi trocada a bomba.



A energia para o funcionamento das instalações de café e da serraria era provida por caldeiras de vapor aquecidas à lenha. Já a iluminação das casas se dava através de um gerador à diesel que era ligado diariamente por duas ou três horas depois do anoitecer.
A vida dos pioneiros sempre foi voltada primeiramente para o trabalho. Por isso o tempo era marcado pelo repicar do sino comandado pelo fiscal. O sino repicava ao alvorecer para despertar os colonos, uma hora e meia depois repicava para chamar ao trabalho, mais tarde tocava para o intervalo do almoço e no final do dia anunciava o fim da labuta diária.
Anos mais tarde, a pedido dos funcionários, o sino foi substituído pela sirene há muito utilizada nas fábricas da capital porque o sino lembrava a escravidão, a falta da liberdade tão essencial para a existência humana.


sábado, 14 de novembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (5)
1.4 Manutenção, Administração e Abastecimento (1)

Manutenção: Serraria e Oficina
O primeiro e principal material de construção da Fazenda Suissa foi a madeira retirada após a derrubada da mata. Portanto as duas serrarias foram peças fundamentais na implantação da infraestrutura. Uma foi montada na sede junto às instalações de café e a outra próxima à estrada de Lins, junto com o galpão da máquina de algodão no vale do Ribeirão Guaimbê.


As toras retiradas da derrubada eram serradas em vigas, vigotas, caibros, pranchões ou tábuas conforme a necessidade. Ainda hoje todo o madeiramento das coberturas na Fazenda Suissa foi beneficiado nessas serrarias, principalmente a da sede, porque a Serraria Velha foi desativada depois de 1924 quando a máquina de algodão pegou fogo queimando uma safra inteira.


Para o desdobro das toras se utilizava uma serra Pica-Pau. As toras eram colocadas em uma plataforma sobre trilhos com sistema de polias ligadas ao motor da caldeira a vapor que acionava uma folha de serra horizontal. Além da Pica-Pau havia outro maquinário como a serra circular, a tupia e na bancada se utilizava todo tipo de ferramenta manual desde a enxó, o formão, o arco-de-pua, e muitos outros esquecidos nas marcenarias modernas. Mas o apito da caldeira e o barulho do incansável vai-e-vem da serra Pica-Pau eram o som do progresso naqueles dias.



Toras com diâmetro maior de um metro não passavam sob a estrutura da serra por isso não eram utilizadas. Assim, depois da derrubada da mata, as mais majestosas árvores eram enterradas em valas profundas e cobertas com terra para não atrapalhar o plantio e o cultivo das lavouras.


 A serra Pica-Pau ficava em uma ponta do galpão e na outra ficava a oficina.

A oficina era outra peça chave para o funcionamento da fazenda. O primeiro mecânico foi o Sr. Schmidt que está sentado sobre a esteira do trator na foto abaixo. Atrás dele vemos seu irmão Willy Schmidt o guarda-livros. Sentado no capô está o gerente geral Ernst Loosli e na frente em pé Max Morel, um dos administradores.


 Max Wirth Junior descreve o advento desta foto da seguinte forma:

“ Essa foto mostra como por si só, um avanço tecnológico pode ser enganoso. Até então havia nas estradas da fazenda somente tração animal de cavalos, mulas e bois. As carroças e os carros de bois tinham grandes rodas de bitola estreita, eram puxadas por 6 juntas de animais que aos pares sob o peso das cangas venciam qualquer terreno. Logo havia 200 mulas e dezenas de carroças à cuidar mas já que não faltava terra para pastagens o problema maior era conseguir carroceiros habilidosos. A colheita aumentava juntamente com a área de plantio. Muitos quilômetros de estrada arenosa, o calor e a sede obrigavam a troca frequente dos animais e jornadas de trabalho reduzidas. Com o acúmulo dessas dificuldades algo tinha que ser feito a respeito dos transportes. A solução do problema parecia ser a mecanização mas como os caminhões Ford e Chevrolet, os únicos disponíveis com qualidade e preço razoável, transportavam pouca carga e sempre patinavam nos areões só restava arriscar a importação da última novidade: o trator de esteira Hanomag que os irmãos Bromberg tinham acabado de receber de sua sede em Hamburgo. Esse trator era sensacional, forte como um tanque de guerra, motor a gasolina com 100 cv, barulhento, acionado por alavancas, manivelas e pedais, com uma cabine atrás do comprido capô de latão polido. Ele puxava uma carreta sobre esteiras com o dobro do comprimento dos carros de boi e capacidade de carga três a quatro vezes maior, adequado ao solo fofo, enfim o veículo ideal! A sensação, o monstro Hanomag e sua gigantesca carreta, durou pouco como costuma acontecer com sensações, pois ficou evidente que um avanço tecnológico no lugar errado pode ser enganoso. Esse primeiro trator de esteira dos anos 1920 chegou cedo demais. O motor superaquecia e as esteiras quebravam em pouco tempo vitimadas pela abrasão da areia. A boa ideia não estava amadurecida porém o feito pioneiro apesar de grandioso foi logo esquecido”

sábado, 7 de novembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (4)

1.3 Instalações de Secagem, Armazenamento e Beneficiamento de Café(3)

Beneficiamento e Casa de Máquina

Junto às tulhas fica o galpão de beneficiamento onde o café em coco é separado de suas impurezas e descascado até passar por uma grande máquina selecionadora que separa os grãos por tamanho ou peneira. Quanto maior e mais regular o grão, melhor é sua qualidade e mais alto o preço de mercado.


Para fazer funcionar todos os elevadores e o maquinário de beneficiamento, foi instalada uma caldeira na casa de máquina adjacente, uma vez que ainda não havia energia elétrica além do gerador que operava apenas a iluminação das casas no início da noite.

  
Posteriormente, com o advento da rede elétrica instalada pela Companhia Paulista de Força e Luz, a casa de máquina foi transformada em sala de cinema para o lazer dos funcionários.


Max Wirth Junior descreve com maestria as dificuldades de implantação da caldeira:
“... Quando ainda morávamos lá, havia na Fazenda Suissa três grandes máquinas à vapor: uma na serraria velha mais ou menos um quilômetro distante de nossa casa junto ao ribeirão onde começavam as pastagens, outra de igual potência logo ao lado para tocar a máquina de beneficiamento de algodão e a maior de todas, um monstro com uma enorme polia, para as instalações de café na sede. As três eram desmontadas em partes e assim transportadas por 40 quilômetros de estrada de terra, as pesadas caldeiras puxadas por dez ou mais juntas de bois e outra parte do maquinário carregado em caminhões, até seu paradeiro definitivo. Avançava-se devagar, passo à passo, com uma parado no Rio Feio onde as caldeiras, demasiadamente pesadas para a ponte suportá-las, tinham que ser atravessadas pelo vau quando as águas do rio estavam baixas, por juntas de bois bem descansados e com grande alarde. Nós podíamos observar e ajudar na gritaria, enfim, uma farra oportuna para a molecada! Graças aos cuidados e experiência de nossos administradores Max Morel e Fritz Walder todos esse transportes chegaram ao destino sem acidentes e o sucesso era comemorado com a tradicional cervejada.”