sábado, 26 de dezembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (11)

1.6 Moradias (2)

O Estilo que Nasceu da Saudade

Para conseguir realizar seus projetos Max Wirth buscou homens de sua confiança na Suíça. A foto abaixo mostra da esquerda para a direita os senhores Fritz Walder (administrador), Ernst Loosli (gerente geral), Walter Schiller (administrador e topógrafo) e Max Morel (administrador).


 Após dez anos de trabalho árduo a Fazenda Suissa chegou ao auge de produtividade. Lavouras com 1.200.000 pés de café produzindo substituíram as matas, exceto em algumas encostas, as pastagens estavam cheias de gado gordo e mão de obra bem estruturada garantia a continuidade dos trabalhos.

Havia chegado a hora de se iniciar um novo projeto. Assim Max Wirth voltou sua atenção para a Fazenda Paredão, próximo da pequena cidade de Oriente e adjacente à ferrovia.
Apesar do sucesso nos empreendimentos os suíços sentiam saudades da terra natal. O primeiro impulso da aventura no Brasil se transformou em rotina de trabalho e cuidados com a família aqui constituída. Ernst Loosli, o gerente geral, merecia uma moradia melhor então, em vez de construí-la conforme o modelo brasileiro optou-se por copiar em escala menor o vistoso chalé chamado Villa Sonnenbühl, residência da família Wirth nos Alpes suíços. Talvez por  praticidade o pioneiro encomendou logo mais uma casa parecida, porém menor ainda, para si na Fazenda Paredão. Assim a Villa Sonnenbühl, construída em 1911, com quatro pavimentos além do sótão, 11 quartos, banheiros, salas e salões, cozinha com depósitos, estrebarias e gazebo gerou logo duas cópias...


 A primeira cópia Max Wirth construiu para si e para sua esposa Emily na Fazenda Paredão em Oriente. Era minúscula para o padrão da época, mas já que os filhos estavam todos na Suíça completando os estudos bastava-lhes uma casa pequena. Tinha apenas um quarto, amplo banheiro, sala com copa de almoço, cozinha com fogão à lenha, despensa e uma varanda. Não havia acesso interno ao sótão, mas tinha um pequeno anexo para serviços.


A segunda cópia, bem maior, foi a casa da família Loosli, construída em 1936. Ernst, Emma, a pequena Lilly e o recém-nascido Fritz moravam na sede de madeira antes de mudarem para sua nova casa de alvenaria. Ao contrário da Villa original esta casa tinha somente um pavimento térreo com 3 quartos, banheiro, copa, cozinha, sala de estar, sótão com dois quartinhos,  grande varanda adequada ao clima tropical e uma piscina que também alimentava o lavador de café. Posteriormente também foi construído um anexo para serviços e, quando a filha mais velha Lilly se casou, foi acrescentada uma suíte no fundo.




Detalhes típicos das construções suíças como os telhados muito inclinados, os oitões revestidos com tabuinhas de madeira em forma de escamas, as paredes das salas revestidas com painéis de madeira e a lareira no centro da casa, compõe um estilo único, resultante da profunda saudade dos suíços que trocaram sua pátria pelo Brasil.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (10)

1.6 Moradias (1)

As duas Casas Sede:
Depois da primeira derrubada em 1922 logo foram construídas muitas casas de madeira para acomodar os desbravadores acampados. Max Wirth fez para si uma casa com aproximadamente 200 metros quadrados, quatro quartos sala e cozinha. A princípio não havia banheiro, depois foi construído ao lado uma casa de banho de alvenaria que também abrigava o gerador à diesel.  Avarandada na volta toda e elevada do terreno natural era uma construção de madeira solidamente implantada no final da fila de casas de seus colaboradores mais próximos. Mesmo antes de ficar pronta ele chamou sua mulher Emilie com os 7 filhos para que viessem da Suíça acompanhá-lo em sua aventura. Seu filho Max Wirth Junior descreve esse evento com maestria:


“A casa de madeira. Saindo do palacete vermelho chamado Sonnenbuehl no Toggenburg (Suíça) onde havia todo conforto como água corrente quente e fria, calefação nos 11 quartos, jardim de inverno, sala de jantar e salão principal, a chegada nesse bangalô sobre palafitas, ainda inacabado, erguido entre toras da queimada e entulhos da obra, deve ter sido um choque para a mãe! Não me lembro do ano - acho que foi em agosto ou setembro - de qualquer maneira era logo após a queimada da mata já derrubada havia semanas, quando as cinzas ainda não estavam misturadas ao solo e a bruma da fumaça encobria a vista deixando o mundo tão triste como após uma devastação atômica. Era pedir demais de uma mãe, exausta após a viagem de três dias com sete filhos empoeirados, suados, famintos e sedentos, sem saber como seria o dia seguinte.


O pai nos havia esperado na estação ferroviária em Albuquerque Lins onde deveríamos ter chegado 2 ou 3 horas antes. Três carros de aluguel e o caminhão da fazenda estavam a postos e por ainda ser necessário percorrer aproximadamente 40 quilômetros seguimos sem mais delongas. No início da viagem havia plantações de café novo, arbustos redondos alinhados, havia carreiras de casas novas de madeira, pastagens e quiçaça, córregos e brejos, depois a verde mata fechada onde enormes borboletas azuis dançavam à nossa frente, acompanhando-nos por um trecho para em seguida desaparecer na selva. Depois a ponte precária sobre o rio, o rápido intervalo para colocar água no radiador e longas retas de estrada na floresta, uma parada num entroncamento e plantações novas. Pessoas nos cumprimentavam com cordialidade. Eram colonos da fazenda que acabavam de consertar o último trecho da estrada. Me lembro...que uma caixa de cerveja foi tirada do caminhão e as pessoas sedentas brindaram com bom humor. A cerveja espumava e transbordava; o auge desse dia de nossa chegada na fazenda Suiça...no final da longa viagem, lá estava nossa casa, o bangalô sobre palafitas...”


Em 1925 Max Wirth construiu para sua família uma casa de alvenaria, muito parecida em sua concepção com a primeira casa de madeira, porém mais confortável e localizada no ponto mais alto da fazenda. Seu principal colaborador, o gerente geral Ernst Loosli, passou a morar na casa de madeira. A foto abaixo mostra a pequena família recepcionando visitas na frente da casa e ao fundo se vê a casa de banho. Em 1936 a família Loosli se mudou para uma nova casa de alvenaria e Walter Schiller passou à morar na casa de madeira.




A casa de alvenaria era maior, também avarandada em três lados, com cinco quarto uma cozinha, um banheiro e salas de jantar e estar. O banheiro tinha duas portas: uma dava para o quarto do casal e outra dava para a varanda e era utilizada por todos os demais moradores da casa. Havia um tanque para lavar roupas no porão e o sótão servia de depósito.


As paredes das salas de jantar e estar eram revestidas com painéis de madeira de 1,50m de altura. Esse bonito detalhe foi importado da Suíça onde é muito utilizado para melhorar o conforto térmico nos invernos rigorosos, quando as paredes de alvenaria irradiam o frio. Não havia porta de ligação entre a cozinha e a sala de jantar, porém uma janelinha embutida na imensa estante com aparador servia de passador para as travessas de comida.

 Essa residência imitava o modelo das casas de bandeirantes, tão em voga na década de 1920 quando o Movimento Modernista redescobriu e passou cultivar valores brasileiros.


Em 1928 os filhos mais novos Hans, Max, Peter, Emil e Verena viajaram para a Suíça à fim de continuar seus estudos. As duas irmãs mais velhas Annemarie e Hanne já se encontravam lá e ficaram encarregadas de cuidar dos irmãos na ausência dos pais. Logo Max Wirth se mudaria para a Fazenda Paredão em Oriente, mas continuou utilizando essa sede sempre que vinha à Fazenda Suissa.

Todos os filhos, um após o outro exceto Annemarie, moraram transitoriamente nessa casa ao retornarem já casados da Suíça, antes de assumirem cada qual suas próprias responsabilidades nas empresas do pai.


sábado, 12 de dezembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (9)
  
1.5 Saúde, Educação e Lazer (3)

Lazer:
Na colônia Santa Luzia tinha um campo de futebol grande onde todo sábado havia jogo. Ali também aconteciam as festas tal como descreve Max Wirth Junior em suas memórias:
“Festa na colônia: eis a inauguração festiva de uma das colônias com aproximadamente 20 casas duplas construídas em madeira sobre alicerce de alvenaria. Chegava gente à pé, à cavalo, de carroça e carro, foguetes subiam ao céu, bombinhas estouravam, bandeirolas esvoaçavam e jorrava espuma de cerveja quente das garrafas.

A sensação da festa era o boi no espeto! O churrasco é essencial para qualquer festa, carne à vontade para todos, o quanto cada um puder comer...O boi assado inteiro, a carne sendo cortada em lascas finas, oferecia especial satisfação aos olhos e ao olfato. Era o ano de1925 ou 26. O pessoal em trajes domingueiros, todos de chapéu, alguns de gravata, se vestiam com formalidade em sinal de respeito.”


Nos anos de 1940 a região de Guaimbê foi eletrificada. Com a vinda dessa nova fonte de energia as máquinas à vapor ficaram obsoletas. A sala da caldeira no final da linha de galpões destinados ao armazenamento e beneficiamento de café passou a abrigar o cinema. Todo sábado o ônibus Pássaro Amarelo trazia 4 grandes rolos de filme que eram apresentados depois do anoitecer.


Mas havia também os saraus dos suíços. Eles cantavam uma espécie de música suíça caipira chamada “Jodel” conforme relata Max Wirth Junior.


“ Na foto vemos a Família Farner, o pai, a mãe, Elsa, Amalie, Emma e Konrad...Não demorou muito para que a filha mais velha, Emma, viesse trabalhar em nossa casa pois já sabia cozinhar. Ela aprendeu culinária com a mãe e canto com o pai que cantava no coral masculino de Stammheim (Suíça) onde tocava um restaurante que chegou à beirar a falência, razão pela qual preferiu emigrar com a família para o Brasil. Quem gosta de cantar deve ter sentimentos e um pendor para o devaneio, e quando a vontade de fugir e o romantismo se misturam, emigrar surge como uma solução... Às vezes os Farner nos visitavam em casa, aí sempre cantávamos todos juntos. Ernst Loosli, o mais importante jovem colaborador de meu pai, sabia cantar o Jodel sem inibição com voz forte conforme a tradição dos Alpes Berneses. 


Juntamente com o timbre soprano de Emma, ou mesmo à três vozes afinadas, entoavam canções comoventes que soavam pela noite estrelada afora. Quando eram acompanhadas por Walter Schiller ao acordeom aí já havíamos um concerto respeitável de coral, cheio de emoções e após derramarmos algumas lágrimas saudosas o sarau se encerrava com o “evergreen” “Sah ein Knab ein Röslein stehn” ou o alegre ¨Dur’s Toggeburg uf und s’Toggeburg ab”. O canto pode construir pontes, até mesmo unir corações ou embelezar um acaso conveniente. Seja lá como for a cantoria ao luar teve efeito pois as três filhas dos Farner se casaram seguidamente: Emma com Loosli, Amalie com Schiller e Elsa com Meier.”


Elisabeth Loosli Massarollo, filha caçula de Ernst e Ema Loosli, relata que na escola havia também aulas de dança. As professoras ensinavam a valsa, o xote e a marcha. Havia uma vitrola que funcionava quando se dava corda para tocar os discos de vinil.
Elisabeth está no centro da foto ao lado de sua irmã mais velha Lily e dos irmãos Fritz e Ernst. Ao fundo o secador e a moega... 
Com tanta música na Fazenda Suissa não é de se estranhar que Elisabeth veio à se casar com Celso Massarollo, um verdadeiro pé-de-valsa...

domingo, 6 de dezembro de 2015

1.Fazenda Suissa 1925 a 1955 (8)


1.5 Saúde, Educação e Lazer (2)

Educação:
A maioria dos imigrantes estrangeiros veio para cá por necessidade, fugindo de uma guerra, crise econômica ou perseguição. Max Wirth foi um dos poucos que veio por opção. Trocou a vida confortável que gozava como industrial na Suíça pela aventura de desbravar terras no Oeste Paulista. Elaborou uma estratégia para cativar colaboradores qualificados nesse fim de mundo. Um ponto fundamental era garantir o acesso à educação não somente aos filhos daqueles que ocupavam cargos de chefia, mas também aos filhos dos colonos. Entre os colaboradores mais próximos havia muitos suíços. Por isso nos primeiros anos havia duas escolas na fazenda: a escolinha suíça, na qual também estudavam seus próprios filhos, e a escola brasileira para a população residente em geral.

A escolinha suíça não existe mais, porém a escola brasileira foi ampliada e adaptada ao longo dos anos. O desenho ilustra a situação da escola naquela época conforme relatos de ex-professoras e alunos.


A escola brasileira se chamava oficialmente Escola Mista da Fazenda Suissa. Ela funcionava numa sala adjacente à casa do farmacêutico. Havia uma varanda de acesso que ficava entre a sala de aula e a casa. No fundo havia um sanitário precário para atender os alunos. Fritz Loosli nos conta de suas professoras Dona Joaninha e Dona Maria Angélica que vinham cedo de Getulina com a linha de ônibus Pássaro Amarelo, almoçavam na casa de Sr. João o farmacêutico e voltavam para casa somente de tardezinha quando o ônibus retornava de Garça. As quatro classes do ensino básico funcionavam na mesma sala. Na foto à seguir Lilly, a irmã mais velha de Fritz Loosli, está sentada na primeira carteira à esquerda. A professora é Dona Maria Angélica.


 Max Wirth Junior descreve seu aprendizado na escola suíça da seguinte forma:
“A escola foi construída dentro do recém-plantado bosque de eucaliptos logo depois de nossa chegada. Era uma construção de madeira sobre palafitas conforme o costume da época, com dois compartimentos e uma grande varanda na frente... Não havia forro, as paredes eram altas, aproximadamente de 3 metros, fechado por um telhado aparente e arejado... Nossa escola era simples – cumpria sua função. Num quarto morava o senhor professor, primeiro o velho, depois o Schinsky. Havia uma cama de ferro branca com molas e colchão de palha, uma caixa que fazia às vezes de criado-mudo, um guarda-roupa, o lavatório de ágata com jarro e uma pequena mesa com cadeira. Ambos os professores preparavam seu próprio chá de manhã, Lipton com leite condensado ou chá mate Leão que vinha embalado numa caixinha de madeira com os dizeres “já vem queimado” para diferenciá-lo do mate verde de chimarrão que era comercializado em barricas. Quando alguém estava de mau humor se dizia “ele está queimado” de forma que nós apenas sussurrávamos “Mate Leão” quando o professor Hauser nos recebia de mau humor para a aula. Ele não gostava de lecionar, preferia nos ensinar trabalhos manuais e nunca mais esquecemos as lições que ele nos deu na bancada cheia de ferramentas que ficava em sua varanda. Mas ele também tinha uma caixa cheia de livros, bem ordenados sobre uma estante de tábuas de sua biblioteca. Eram livros bons, escolhidos à dedo, pois a leitura era sua paixão e se Konrad Hauser, o péssimo professor que logo seria demitido sem dó nem agradecimentos pelo nosso pai, nos deixou algo para a vida seu legado foi o amor à leitura... 


Professor Walter Schinsky substituiu o primeiro professor... porque após dois anos de aulas particulares ainda ignorávamos a tabuada mesmo conhecendo de cor a história de Robinson Crusoé. Fazíamos trabalhos manuais, montávamos à cavalo, atirávamos, mas nossa ortografia era precária, os conhecimentos de matemática eram um escândalo, enfim, estávamos muito atrasados exceto na leitura. Por isso a vinda de Walter Schinky foi como uma declaração de guerra, um estrondo após o qual fomos bombardeados com conhecimento e forçados ao estudo... De dia os estudos e as brincadeiras nos mantinham ocupados, de noite Karl May nos roubava o sono porque líamos até a vela se extinguir. Acho que podemos considerar que tivemos uma infância feliz. Não havia rádio, muito menos televisão, mas líamos e conversávamos – líamos muito e certos livros até repetidas vezes.. ”


(A leitura à qual Max Wirth Junior se refere são os livros da série de faroeste infanto-juvenil cujos heróis eram o índio apache Winnetou e seu amigo caçador Old Shatterhand, ambos retratados abaixo junto com a foto do autor Karl May)